Avaliação financeira e governança: conselheiros consultivos e sustentabilidade empresarial

 


Elementos chaves de finanças e a influência dos conselhos consultivos

Se tomarmos como base os princípios do IBGC, podemos tomar alguns elementos-chave que um conselheiro consultivo pode e deve influenciar ao verificar as finanças de uma empresa. 

Ao revisar e aprovar a estratégia financeira da empresa, deve assegurar que esteja alinhada aos objetivos estratégicos e à visão de longo prazo. Isso inclui, por exemplo, a definição de metas financeiras, a avaliação de oportunidades de investimento e a alocação de recursos financeiros.

Também, deve supervisionar e monitorar o gerenciamento de riscos financeiros, incluindo a identificação e avaliação de riscos, o desenvolvimento de planos de mitigação destes riscos e a monitoração contínua. Por conseguinte, deve avaliar o desempenho financeiro, incluindo a análise de demonstrativos financeiros, relatórios de orçamento e projeções financeiras, ajudando a identificar tendências financeiras e oportunidades de melhoria.

Deve ter atenção, e avaliar e supervisionar os controles internos em relação às finanças, incluindo a implementação de políticas e procedimentos financeiros, o monitoramento do ambiente de controle e a revisão dos processos de auditoria.

Por fim, garantir que haja transparência financeira, incluindo a divulgação de informações financeiras precisas e confiáveis aos acionistas e ao mercado em geral.

No livro "Effective Leadership for Nonprofit Organizations: How Executive Directors and Boards Work Together" , Thomas Wolf explora como os conselhos consultivos podem trabalhar com líderes executivos para desenvolver e implementar estratégias financeiras eficazes para organizações sem fins lucrativos.

Conselheiro consultivos - hard & soft skills

Para contribuir positivamente na avaliação financeira, os conselheiros consultivos devem possuir ou adquirir um conjunto de habilidades e conhecimentos técnicos e comportamentais (hard e soft skills) que permitam uma atuação eficaz. Abaixo listo alguns que entendo serem importantes e que vivi em minha experiência profissional:

Habilidades Técnicas (Hard Skills):

  • Conhecimento financeiro: bom conhecimento de finanças corporativas, incluindo contabilidade, análise financeira e gerenciamento de riscos.
  • Análise de dados: habilidades de análise de dados para interpretar relatórios financeiros e avaliar as tendências financeiras.
  • Conhecimento do mercado: entender o mercado em que a empresa atua, incluindo seus concorrentes, fornecedores e clientes.
  • Conhecimento das regulamentações: ter conhecimento das regulamentações que afetam a empresa, incluindo as normas contábeis e as leis tributárias.

Habilidades Comportamentais (Soft Skills):

  • Pensamento crítico: avaliar a informação financeira e tomar decisões informadas.
  • Comunicação: se comunicar efetivamente com outros membros do conselho, a gerência e os acionistas.
  • Ética: ter altos padrões éticos e ser capaz de avaliar decisões financeiras de forma objetiva.
  • Adaptabilidade: ser capaz de se adaptar a mudanças no mercado e nas operações da empresa.
  • Visão de longo prazo: avaliar as decisões financeiras e seu impacto a longo prazo na empresa.

Essas são apenas algumas das habilidades e conhecimentos para contribuir positivamente na avaliação financeira de uma empresa, além de ser importante lembrar que o conselheiro consultivo deve trabalhar em conjunto com a gerência da empresa e os demais membros do conselho para tomar decisões informadas e promover a sustentabilidade financeira e o crescimento da empresa a longo prazo.

Pequena, média ou startup - informações adequadas

Para que o conselho consultivo possa realizar seu trabalho adequadamente é importante que a administração forneça as informações necessárias para isso. Começando pela descrição clara da estrutura organizacional, incluindo as funções e responsabilidades dos membros da gerência e do conselho consultivo, seguida do plano estratégico, incluindo informações sobre os objetivos de longo prazo, as metas e os planos de ação. Depois, os relatórios financeiros completos e precisos, incluindo demonstrações financeiras, balanços patrimoniais, demonstrações de fluxo de caixa e relatórios de desempenho financeiro, além dos procedimentos de controle interno implementados para garantir a integridade destas informações, e os principais riscos e oportunidades enfrentados, incluindo riscos financeiros, operacionais, de mercado e regulatórios. Algo que por vezes é deixado de lado são as políticas e práticas de remuneração, incluindo a remuneração dos membros da gerência e do conselho consultivo, além das políticas e práticas de governança corporativa implementadas, incluindo as práticas de divulgação de informações e as políticas de conflito de interesses e o planejamento sucessório, incluindo planos para a sucessão da gerência e do conselho consultivo.

Essas informações permitirão que o conselho consultivo avalie o desempenho da empresa e tome decisões informadas em relação às finanças e à governança corporativa. Essas informações devem ser fornecidas de forma clara e precisa e disponível antecipadamente aos eventos de revisão pelo conselho para discutir quaisquer questões ou preocupações.

Avaliando os resultados – o que observar

Ao analisar os relatórios financeiros, o conselheiro consultivo deve prestar atenção a vários indicadores e dados financeiros que refletem a saúde financeira e permitem a interpretação e tomada de decisão.

Karen Berman e Joe Knight no livro "Financial Intelligence for Entrepreneurs: What You Really Need to Know About the Numbers" fornecem um guia prático para empresários e conselhos consultivos sobre como interpretar e utilizar informações financeiras para tomar decisões informadas e estratégicas.

A receita é uma medida da saúde financeira, ao avaliar se a receita está crescendo ou diminuindo, e se a empresa está cumprindo suas metas de receita, enquanto a margem de lucro medirá a eficiência operacional da empresa, pois indicará como está gerenciando os custos de forma eficaz. O fluxo de caixa ou o EBITDA (Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization) indicará a capacidade de gerar caixa para financiar as operações e investimentos, incluindo permitindo identificar as áreas que estão gerando ou consumindo mais caixa, e o nível de endividamento indicará se a empresa é capaz de pagar suas dívidas. Importante, aqui, avaliar se a empresa está se endividando de forma sustentável ou se está se endividando em excesso. O Retorno sobre o patrimônio líquido (ROE), mede a rentabilidade da empresa em relação ao seu patrimônio líquido, indicando a geração de [um retorno satisfatório para os acionistas.

O EVA mede a criação de valor econômico de uma empresa após considerar todos os custos de capital empregados, e irá determinar se está sendo criado valor econômico para os acionistas. Compara a performance com os concorrentes e identificar as áreas que precisam de melhorias para aumentar o valor para os acionistas. A DVA mostra como a empresa gera e distribui valor entre seus stakeholders, e irá determinar como está se gerando valor e distribuindo entre os stakeholders, incluindo acionistas, funcionários, fornecedores e comunidade.

O conselheiro deve criticar as informações apresentadas no relatório financeiro, questionando a qualidade das informações, a consistência e a integridade dos dados, e a coerência dos planos de negócios e metas estabelecidos pela empresa com os resultados financeiros apresentados, identificando riscos e oportunidades presentes e como eles são gerenciados pela administração, e tem a autonomia e atribuição para aconselhar a administração sobre os indicadores e ajudar a identificar áreas que precisam de melhorias para alcançar os objetivos, sugerindo tais melhorias nos processos e nas políticas financeiras da empresa, e apontando oportunidades de crescimento e riscos que devem ser gerenciados.

Finanças, SDGs, ESG e empresas válidas

Em conjunto com a análise de fatores ESG (ambientais, sociais e de governança), bem como com os SDGs (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) da ONU selecionados pela gestão, se pode avaliar as finanças e como ela está desempenhando em termos de impacto ambiental, social e de governança.

A integração deste princípios ESG e SDGs junto com a análise financeira ajudar a identificar se a empresa está alinhada com as metas globais de sustentabilidade e que têm um propósito claro para melhorar a sociedade e o meio ambiente, ajudando a identificar se têm práticas insustentáveis e que precisam melhorar seu desempenho ESG para se tornarem mais responsáveis e sustentáveis.

Isso é possível através da avaliação da política e a estratégia da empresa em relação a esses temas, bem como sua execução e monitoramento, o engajamento com seus stakeholders e a comunidade, e se está divulgando informações transparentes e precisas sobre seu desempenho ESG.

Além disso, considerar se a empresa está comprometida em melhorar seu desempenho ESG ao longo do tempo e se está estabelecendo metas e indicadores de desempenho para medir seu progresso. Uma empresa que se compromete a melhorar seu desempenho ESG e trabalha de forma proativa para atingir esses objetivos pode ser considerada mais valiosa e com propósito do que aquelas que não o fazem.

Há diversos prêmios e certificações que avaliam o desempenho ESG das empresas listadas, tanto no Brasil quanto globalmente. Essas premiações e certificações são concedidas por organizações independentes que avaliam o desempenho em relação a critérios ESG específicos.

No Brasil, um dos prêmios mais conhecidos é o "Empresas Mais", concedido pelo jornal "O Estado de S. Paulo" em parceria com a Aaustin Rating e Fundação Instituto de Administração (FIA), que avalia o desempenho financeiro e de governança das empresas, bem como seu desempenho ambiental e social. Também o Selo ESG, concedido pela B3 (a bolsa de valores brasileira) a empresas que apresentam desempenho satisfatório em relação aos critérios ESG.

Globalmente, existe o Dow Jones Sustainability Index, o FTSE4Good Index Series, o CDP (Carbon Disclosure Project), o PRI (Principles for Responsible Investment), o GRESB (Global Real Estate Sustainability Benchmark). 



Ressaltamos o ESG MSCI Rating desenvolvida pela empresa MSCI, uma das principais fornecedoras de índices de mercado de ações e também oferece uma série de soluções de análise e avaliação ESG para investidores e empresas. Avalia as empresas com base em uma ampla gama de critérios ESG, incluindo o gerenciamento de emissões de gases de efeito estufa, a diversidade da força de trabalho, a transparência na divulgação de informações e a integridade do conselho de administração. As empresas são classificadas em uma escala de AAA a CCC, com base no desempenho ESG relativo de sua indústria.

Essa classificação pode ser usada por investidores para avaliar o desempenho ESG de uma empresa antes de investir nela. Alguns fundos de investimento, por exemplo, exigem que as empresas em que investem tenham uma classificação ESG alta para serem elegíveis para inclusão em seus portfólios.

Boas práticas de Governança Corporativa

Tanto o IBGC quanto a CVM possuem diretrizes que podem ser utilizadas como referência para a avaliação financeira e para a incorporação dos princípios de ESG nas empresas.

Se considerarmos por exemplo o que está proposto no livro "Corporate Governance Matters: A Closer Look at Organizational Choices and Their Consequences" de David Larcker e Brian Tayan, eles examinam as práticas de governança corporativa e como elas afetam o desempenho financeiro das empresas. Também fornecem insights sobre o papel dos conselhos consultivos na supervisão da gestão financeira e tomada de decisões estratégicas.

Nos princípios de governança do IBGC, uma gestão transparente, responsável e ética, levando em consideração não só os interesses dos acionistas, mas também dos demais stakeholders, como funcionários, fornecedores, clientes e a sociedade em geral. 

  • Transparência e prestação de contas: divulgar informações claras, confiáveis e acessíveis a respeito de sua performance financeira, bem como informações sobre sua gestão ambiental, social e de governança;
  • Equidade: tratar todos os stakeholders de forma justa e igualitária, sem discriminação de qualquer tipo;
  • Responsabilidade corporativa: ser socialmente responsáveis e buscar minimizar seus impactos ambientais e sociais negativos, buscando sempre contribuir para o desenvolvimento sustentável.

Estes princípios não estão agrupados em um capítulo ou tópico específico, mas permeiam toda a estrutura de governança corporativa, mas é possível indicar alguns capítulos e tópicos dos Princípios de Governança Corporativa do IBGC que estão diretamente relacionados a eles:

  • Transparência e prestação de contas no capítulo 4 - Divulgação de Informações e Comunicação com os Stakeholders;
  • Equidade no capítulo 2 - Direitos dos Acionistas;
  • Responsabilidade corporativa no capítulo 6 - Responsabilidade Corporativa e Sustentabilidade.

A incorporação dos princípios ESG não se limita aos capítulos específicos de governança corporativa, mas deve ser uma preocupação transversal a todas as áreas e aspectos da gestão empresarial.

Como reguladora do mercado de capitais, a CVM estabelece regras e diretrizes que podem ser utilizadas como referência para a avaliação financeira e incorporação de princípios ESG pelas empresas. 

  • Instrução CVM nº 480/2009: que estabelece a obrigatoriedade de as empresas divulgarem informações sobre sua gestão de riscos, incluindo riscos ambientais e sociais;
  • Instrução CVM nº 561/2015: que estabelece a obrigatoriedade de as empresas divulgarem informações sobre seus impactos ambientais e sociais, incluindo informações sobre mudanças climáticas e uso de recursos naturais;
  • Código ANBIMA de Regulação e Melhores Práticas para as Atividades de Private Banking no Brasil: que estabelece diretrizes para a incorporação de critérios ESG na análise de investimentos pelos bancos privados.

Se eu pudesse resumir um propósito para o conselheiro consultivo em relação à avaliação financeira das empresas, eu diria que seu papel é garantir que a empresa tenha uma gestão financeira sólida e eficiente, de forma a maximizar o valor para os acionistas e demais stakeholders. Para isso, o conselheiro deve estar apto a avaliar as informações financeiras da empresa, bem como a estratégia de negócios e as práticas de governança corporativa, levando em conta não apenas os aspectos financeiros, mas também os aspectos ambientais, sociais e de governança. Além disso, o conselheiro deve ter uma visão crítica e estratégica, buscando identificar riscos e oportunidades que possam impactar a empresa no curto e longo prazo.


Qual sua opinião? Suas experiências? Conte mais nos comentários. Adoraria saber mais sobre vocês, e suas ideias! Aguardo ansioso!


Referências:

  • "Effective Leadership for Nonprofit Organizations: How Executive Directors and Boards Work Together" por Thomas Wolf
  • "Financial Intelligence for Entrepreneurs: What You Really Need to Know About the Numbers" por Karen Berman e Joe Knight
  • "Corporate Governance Matters: A Closer Look at Organizational Choices and Their Consequences" por David Larcker e Brian Tayan
  • IBGC, Princípios da Governança, 2015
  • Board Academy, apostila Programa de Formação de Conselheiros Consultivos


Comentários